Todos gostamos de ser sábios. E como a corrida é concorrida, de sábio todos temos um pouco.
Já houve tempos, já, em que isso de se ser sábio era só para alguns poucos e eleitos. Depois, quando se começou a banalizar a gentileza de dizer de outro sábias palavras essas, a coisa caiu pela plebe abaixo, democratizou-se, e deu nisto mesmo: é sábio quem quer.
Portugal, aliás, é um país de sábios. Porque ainda não descobrimos porque ainda somos país há tantos séculos. Quando isso acontecer, arriscamos a que acabe o país, logo os sábios. Mas o mais provável é que os outros sejam suficientemente sábios para não nos pegarem neste país. Pelo que, assim visto, estamos condenados a ser país e sábios nele e dele.
Porque o mais sábio é o que sabe que não sabe (a história do nada sabe foi um exagero retórico). E saber que não se sabe tudo já é pensamento sábio. O saber do sábio não se aprende em universidades, laboratórios, investigações, fazeres, saberes. Isso é fácil demais para um sábio. Pode dar status social ou académico, lá isso dará, mas não dá a condição.
Ser sábio é ver mais longe. Os outros olham e o sábio vê. O sábio descobre no emaranhado do banal, o fundamental. Isso não se aprende, é-se. Ou não.
Pois eu acho que sou sábio. De quê? Ora sei da minha vida que já não é curta nem é coisa pouca. Sobre ela ninguém sabe mais do que eu. E eu mesmo ainda vou em metade da missa no saber o que devia saber. Se quiserem, sou um auto-sábio. Mas sábio. Ora essa.
Bom, ser sábio e ser sábio reconhecido, isso é outro assunto. Um verdadeiro dilema. Que distingue os melhores entre os sábios. O sábio bom consegue ser sábio e reconhecido como tal. Do sábio fraco, não reza a história. Porque só ele sabe que é sábio.
Os sábios nem sempre têm a vida facilitada. Até chegam a ser olhados com desconfiança. Fogem deles porque sabem demais. Podem até saber aquilo que não é conveniente que se saiba. Assim, regra importante, convém a um sábio estar de bem com o poder (nada pior que ser sábio do contra). Os ministros dizem que ele é sábio, toda a gente acredita. O sábio passa a ter fama e proveito.
Portugal, país de ignorância encartada, não se liga muito aos sábios. Até se agradece que eles emigrem para não destacarem a santa ignorância cá da casa. Vão lá para as Universidades dos States ou outras que tais e desamparem a loja porque senão ainda vão querer desequilibrar o défice com despesas em laboratórios e em investigações complicadíssimas.
Finalmente, o nosso bom governo descobriu
três sábios três, deu-lhes prestígio, honra e título, juntou-os e nomeou-os para apreciarem as propostas da neo-privatização da Galp. Um dos sábios já foi ministro e trabalhou para um dos concorrentes. Um outro pertence aos corpos gerentes da gasolineira a leiloar. O terceiro, menos famoso, é Sapateiro pelo que deve saber como se descalçam estas botas. Sabem todos muito e muito a propósito. Como a escolha vai dar bernarda, os sábios dão ainda o sábio jeito ao Governo de dizer:
foram os sábios, meus senhores, foram os sábios! Temos pois três sábios para um governo sábio. Pois é, voltando à vaca fria,
sábio sou eu e não sei tanto.